domingo, 15 de novembro de 2009

Uma nação totalmente dominada

Há dois meses tive a oportunidade de viajar pelo sul da Índia. Aproveitei para conhecer algumas cidades e, especialmente, o litoral. Em minha jornada para a praia, hospedei-me por um dia num hotel em Mahabalipuram. Apesar da cidade ser conhecida pelos vários templos históricos e por ter sido uma das regiões atingidas pelo Tsunami em 2004, o que mais me chamou atenção foi um simples forro de mesa que se encontrava no restaurante do hotel. Ele continha um texto escrito por Lord Marcualays em 1835 (foto acima), durante o domínio inglês sobre a Índia, nas seguintes palavras:
“ Eu tenho viajado por todo o território da Índia e não vi sequer uma pessoa que seja mendigo ou ladrão. Tanta riqueza eu tenho visto neste país, tais como os valores morais, pessoas de tal calibre que eu não creio que nos possamos conquistar este país, não ser que quebremos a ‘espinha dorsal’ desta nação, que é sua heranca espiritual e cultural. Portanto, eu proponho que nós mudemos esse antigo sistema educacional, a sua cultura, pois se os indianos pensarem que o que é estrangeiro e ingles é bom e melhor que o deles, eles perderão sua auto-estima, sua cultura nativa, e se tornarão o que queremos deles, uma nação totalmente dominada”. (Carta de Lord Macualays ao Parlamento Britanico – 02/02/1835)*.
Fiquei imaginando o tamanho mal que os ingleses trouxeram para a Índia e como o método de dominação europeu é maldoso e desumano com as civilizações dominadas. Temos como maior exemplo as tribos indígenas americanas que foram massacradas e extintas por espanhóis e portugueses durante séculos na conquista do território centro-sul do continente. Idiomas e culturas que nunca chegaremos a conhecer desapareceram junto a milhares de pequenas tribos ao longo da América do Sul e Central. Civilizações importantes como os Maias e Incas foram praticamente extintas, restando a nós somente eleger as ruínas das cidades restantes como ‘Maravilhas do Mundo Moderno’. O mesmo ocorreu na Austrália, onde os aborígenes foram massacrados e também quase extintos para que a sociedade inglesa se estabelecesse no local. Na Índia, eles não conseguiram exterminar a população e utilizaram a força do convencimento para ganhar a ‘batalha’. E o que hoje vemos na Índia não é uma Índia original, cheia de culturas e costumes antigos, mas uma Índia mesclada, onde se pode observar pessoas adorando árvores no meio de uma avenida cheia de carros de marcas europeias dirigidos por jovens em mini-saias e tops. Vemos um noivo em trajes típicos montado num cavalo branco em direção ao local do casamento acompanhado por convidados vestindo calças jeans e camiseta polo, cantando “YMCA”. Vemos milhares de mendigos e pedintes na rua e culpamos o governo pela falta de investimento com a população. Vemos sujeira para todos os lados e culpamos os indianos pela falta de educação… Para tudo! Se em 1835, a Índia era um país fértil, rico, limpo e organizado, por que hoje sofremos tanto com a sujeira, a pobreza e a poluição neste país? Será que isso é uma tradição milenar Indiana? Será que eles sempre viveram assim?
Depois do texto de forro-de-mesa que li no restaurante em Mahabalipuram, comecei a estudar mais sobre a história da Índia antes do domínio inglês. E o que se descobre é que a Índia de hoje é exatamente o que os ingleses esperavam obter: uma população extremamente dominada a ponto de largar todas as suas origens, todo o seu caráter, todo o seu orgulho de ser indiano para se transformar numa população mesquinha, ambiciosa, que não se preocupa com o cidadão do lado. Uma população onde os ingleses podem chegar, fazer a festa e deixar a sujeira para os indianos limparem. Mas o que os ingleses não ensinaram aos indianos foi como limpar a sujeira… afinal, ensinar para que, já que a Índia não é mais sua colônia? Agora a Índia é um país independente e tem que aprender a se virar sozinha… sem riquezas, sem normas, sem origens, sem ajuda… e a Índia segue seu caminho, passo a passo bem devagar para restaurar aquilo que os ingleses tiraram dela… isso é Incredible India!

*Texto original em inglês: “I have travelled across the length and breadth of India and I have not seen one person who is beggar, who is a thief. Such wealth I have seen in this country, such moral values, people of such caliber, that I do not think we would ever conquer this country, unless we break the very backbone of this nation, which is her spiritual and cultural heritage and therefore, I propose that we replace her old and ancient education system, her culture, for if the Indians think that all that is foreign and English is good and greater than their own, they will lose their self-esteem, their native culture and they will become what we want them, a truly dominated nation”.
(Lord Macualays address to the British Parliament – 02/02/1835).


domingo, 8 de novembro de 2009

Paz e amor


Índia não é cultura, é muita cultura! Quanta coisa não deve ter sido influenciada pela cultura indiana e/ou hinduismo no passado e nem sabemos. Como já mencionei num post anterior, Hitler foi fortemente influenciado pela cultura indiana na luta por sua “causa”, durante a Segunda Guerra Mundial. Alguns historiadores acreditam que o Cristianismo também teve forte embasamento nas escrituras hinduístas. A santíssima trindade pode ter nascido com base na Trindade hindu: Brahma, Vishnu e Shiva (Pai, Filho e Espírito Santo). Outros mais polêmicos descrevem que a vida de Cristo e a de Krishna apresentam tantos fatos semelhantes que chega-se a duvidar se o Jesus da Bíblia realmente existiu ou se é uma versão ocidentalizada da vida de Krishna...
Mas a influência mais recente da cultura indiana (desconsiderando a atual “moda pop-indiana” pós-novela das 8) pode ser vista no movimento hippie, que teve seu momento-chave nas décadas de 60 e 70. Muitos dos participantes do movimento da época eram soldados vindos da Guerra do Vietnã que tiveram contato com a cultura asiática. Os hippies eram contra guerras, desigualdades sociais, materialismo, etc etc etc. Assim, esses soldados trouxeram ao movimento hippie parte da filosofia hindu e budista, como o desapego aos bens materiais, a meditação, o uso de incenso para purificação do ambiente, e principalmente no vestuário, nas saias longas, camisas tingidas e calças boca-de-sino. Quem sabe a liberadade sexual também não sofreu influência do Kamasutra..? A Mandala, figura circular com 3 intervalos iguais, era o principal símbolo do movimento Hippie, tambem trazido dos indianos.
Apesar da Índia continuar sendo um país com culturas e tradições altamente exóticas para nossos olhos, não podemos negar que sempre carregaremos conosco um pouquinho de seus costumes... um pedaco da história ocidental estará sempre ligado às origens e ensinamentos asiáticos.
O que para eles é tradição milenar, para nós sempre será a moda da estação... infelizmente...


terça-feira, 3 de novembro de 2009

Felicidade


Há alguns dias atrás, li um texto na internet comentando sobre um livro escrito pela psicologa Sonja Lyubomirsky. O nome do livro é “The how of happiness” e descreve passos para alcançar a tão sonhada felicidade; mas lógico, tudo sob o ponto de vista da psicologia e após anos e anos de estudos dedicados a este assunto. Pois bem, o livro me chamou atenção e resolvi comprá-lo. Li-o todo em uma semana. Sempre tive atração pelo comportamento humano, apesar de minhas escolhas profissionais terem me levado para outro lado da ciência. Mas nunca perdi minha curiosidade em desvendar os mistérios do pensamento humano. O livro é simples e objetivo; nada de auto-estima, é pura ciência. E o mais importante, a escritora coloca no livro muito do que nós já sabemos, mas insistimos em esquecer o tempo todo: “A felicidade só depende da gente”. Isso mesmo, só depende de mim para eu ser feliz e ninguém mais. E, de acordo com Sonja, o primeiro passo para ser feliz não é difícil, mas acredito que, para a maioria das pessoas, deve ser um processo muito doloroso de se conquistar: “...ser responsável pelas próprias ações e as conseqüências que elas trazem em nossas vidas...”
Realmente, se responsabilizar pelos próprios insucessos profissionais, amorosos, financeiros ou qualquer que seja, é uma tarefa complicada para quase todos nos. Quase todos...
Mas o que psicologia, felicidade e aceitação dos erros tem a ver com a Índia? Tem muito a ver.
Veja bem. Cresci num país onde a população está mais do que acostumada em culpar o governo pela falta de recursos, a polícia pela criminalidade, a televisão pela falta de respeito dos filhos em relação aos pais, a corrupção dos outros pela nossa falta de dinheiro, o colega de trabalho oportunista pela nossa promoção adiada, Deus pela falta de fé, o fast-food pelo nosso excesso de peso, etc etc etc. Não conheço um brasileiro que não tenha algo a reclamar, até eu mesma o faço. E assim continuamos vivendo insatisfeitos, problemáticos, ambiociosos... Respeitamos as leis dos países alheios, mas preferimos criticar nossos métodos a modificá-los. E quando vemos os mesmos erros em outros países então... encontramos a fonte de ataque para nosso descontentamento. Esclareco logo que esse comentário é generalizado. Para toda regra, existem exceções.
Mas o que vejo aqui na Índia é que, apesar da pobreza, da corrupção, da falta de higiene, da poeira e tudo o mais de ruim que aqui possa ter, as pessoas são felizes. Ou pelo menos, demonstram ser. Se chove, todos festejam a chuva bem-vinda que veio lavar o ceu. Se faz sol, eles tambem festejam. Eles sabem que o país nao é o melhor do mundo, estão atentos à corrupção dos políticos, à pobreza, mas não fazem disso motivo para viverem uma vida cheia de problemas e frustrações. Claro que, você também não vai ver indianos cara-pintada saindo as ruas em protesto contra o governo, nem milhares de ONGs espalhadas pelo país “informatizando” crianças carentes das favelas.
Então, o faz com que os indianos demonstrem mais felicidade do que os brasileiros? Volto a teoria de Sonja Lyubomirsky, e acredito que a felicidade não depende só de sermos responsáveis por nossos atos, mas principalmente, vem do fato de apreciarmos cada momento de nossas vidas como algo especial. E é o que se faz aqui. Os indianos sabem apreciar detalhes da vida que, para nós, são motivos de estress, algo que podem nos deixa agressivos e tristes durante todo um dia. Eles são mais pacientes e relevam mais os defeitos, os erros, as imperfeições. Eles julgam menos e compreendem mais.
Quem mora aqui sabe o quanto o trânsito é infernal, o atendimento em bancos e lojas é ocioso, o sistema é ineficiente. Mas, olhando do outro lado do vidro do carro pode-se ver que as pessoas não fazem desses problemas um peso nas costas. Muito menos se incomodam com isso. Do contrário, elas sorriem, se divertem, tentam extrair o que há de melhor nessas situações... e a vida continua...
Sonja, afinal, estava certa: A felicidade só depende da gente! E se só depende de mim para ser feliz em qualquer situação que a vida me coloque, por que não arriscar? Melhor arriscar em ser feliz do que viver uma vida de medos, angústias e frustrações que, na verdade, nao dependem só mim em modificá-las. Não aprendi a ser feliz na Índia. Aprendi que sempre fui feliz, mas não sabia. E estou aprendendo a demonstrar mais minha felicidade. E isso traz efeitos colaterais tão bons...